COP30: ciência reconhece saber de povos tradicionais, afirma Finep
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A ciência reconhece o saber de povos tradicionais na relação com o meio ambiente e pode trabalhar junto com esses conhecimentos na busca por soluções contra o aquecimento global e as mudanças climáticas.
A afirmação é do presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Luiz Antonio Elias. Vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Finep tem o papel financiar pesquisa e inovação no país.
Às vésperas da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), marcada para o período de 10 a 21 de novembro, em Belém, Luiz Antonio Elias conversou com a Agência Brasil sobre temas como agenda climática, identidade da ciência brasileira e orçamento para fomento à inovação.
Aos 72 anos, Luiz Antonio Elias é economista e pesquisador do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). Por oito anos, foi secretário executivo do MCTI, nos governos dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Elias será um dos participantes do encontro internacional em Belém, que reunirá delegações governamentais e organizações da sociedade civil de todas as partes do planeta para buscar soluções para o aquecimento global e a mudança climática.
A entrevista foi na sexta-feira (3), no intervalo de uma série de painéis temáticos com representantes do setor científico tanto de organizações da sociedade civil quanto de órgãos governamentais na sede da Finep, no Rio de Janeiro.
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Confira a entrevista:
Agência Brasil: Qual o papel da ciência no enfrentamento das mudanças climáticas?
Luiz Antonio Elias: Primeiro eu acho que é fundamental, cada vez mais, agregarmos conhecimento a essa temática. É inegável que teremos uma elevação do grau [Celsius], isso vai impulsionar ou trazer consequências fundamentais para qualidade de vida, para o próprio negócio e para a economia.
Então o que estamos fazendo aqui é uma discussão efetiva com a comunidade científica para que possamos implementar políticas públicas cada vez mais fortes, decisivas e nos desafios que a sociedade brasileira assim exige.
Olhando que, no primeiro momento a COP30, e nesse aspecto a sua pergunta, a ciência é fundamental, nos dá os parâmetros, nos traz os elementos de construção das diversas questões que vão afetar clima, qualidade de vida, a saúde, a sociedade como um todo do planeta e, consequentemente, no Brasil. Inclusive, áreas que são extremamente importantes, como a questão do agronegócio, a questão urbana das sociedades. A ciência pode nos dar os elementos de construção dos parâmetros para enfrentar esses desafios.
Agência Brasil: A gente pensa muito em ciência associada a um ambiente acadêmico, institutos de pesquisa, laboratórios, mas se fala também sobre o conhecimento ancestral, povos tradicionais, como indígenas e quilombolas. Eles têm um conhecimento que pode contribuir com a ciência?
Luiz Antonio Elias: Não tenho dúvida disso. Efetivamente. Isso já foi mais do que demonstrado, esta capacidade de aprendermos com ancestralidade, aprendermos com os conhecimentos tradicionais. Inclusive, na área dermatológica, na área da biodiversidade, eles têm nos permitido encontrar elementos na natureza para a área de saúde.
Então acho que a sua pergunta é importante e temos que respeitar em todos os códigos, inclusive no código de propriedade intelectual, isso está respeitado, ou seja, como nós podemos repartir benefícios com as comunidades tradicionais a partir desse conhecimento da ancestralidade.
Agência Brasil: No encontro desta sexta-feira, falou-se em soberania e dar uma identidade à ciência brasileira. Que identidade é essa?
Luiz Antonio Elias: Nós temos, enquanto país, uma oportunidade única de demonstrar para o mundo como temos capacidade de fazer todas essas transições, a questão ecológica, a questão socioambiental, a questão energética, em vista de não só ser um país continental, mas encontrar na questão do bioma Amazônia um elemento decisivo para essa transformação.
Ali tem uma parte sensível do planeta a nível global, e a perspectiva de construção de políticas públicas cada vez mais densas e fortes demonstra para o mundo a nossa capacidade, inclusive integrando os países da região, por exemplo, a organização chamada OTCA [Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, formada por Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela].
O presidente Lula, inclusive em seu último discurso na ONU, afirma que, sem ciência, não tem inovação, sem inovação, o Brasil não se desenvolve.
Agência Brasil: Falando diretamente da Finep, agenda climática é o foco principal da fundação neste momento?
Luiz Antonio Elias: Eu não diria que é o foco principal. A Finep tem um leque amplo de discussões, que vão desde o fortalecimento, portanto, nos seus instrumentos reembolsáveis e não reembolsáveis à pesquisa e aos laboratórios nacionais, assim como as questões econômicas, ou seja, a dimensão do Complexo Industrial da Saúde [Ceis], a dimensão da biodiversidade brasileira, a dimensão de minerais estratégicos, que hoje são tão discutidos, tendo em vista a geopolítica internacional, enfim, vários temas que afetam inclusive a própria indústria. Ou seja, como fazer a taxa de investimento ser mais efetiva, a partir da melhoria da produtividade, diminuição do custo unitário de produção e maior valor agregado à manufatura brasileira.
Tudo isso tem sido os elementos de construção da Finep. Mas esse ponto específico, tratar a descarbonização, hidrogênio verde, energias renováveis, a transição ecológica, é um ponto central das políticas da Finep.
Agência Brasil: O orçamento da Finep está adequado?
Luiz Antonio Elias: A Finep tem tido por parte do presidente da República e dada a centralidade que esta agenda ganha na coordenação da ministra Luciana Santos [MCTI] um movimento de inflexão radical em relação ao governo anterior. Nunca esteve com tantos recursos, quer no reembolsado, quer no não reembolsado.
Ainda mais agora por um projeto de lei de iniciativa do governo federal, que teve à frente o senador Jaques Wagner e o senador Rogério Carvalho como relator, que nos permitiu acessar o superávit financeiro, ou seja, recursos que estavam represados anteriormente e que foram incorporados ao orçamento financeiro. Isso representa mais R$ 22 milhões em crédito. [Após a sanção, o projeto de lei foi convertido na Lei 15.184/2025].
É preciso que as políticas públicas também tenham um impacto não só de inclusão, mas no mundo do trabalho. Então, eu diria que a Finep nunca esteve tão bem quanto agora, e essa é uma determinação de, cada vez mais, transformar a Finep em uma política de Estado.