'A gente precisa começar a dar valor pra quem faz som realmente'
Homenageado esta semana pela Câmara de Ribeirão com a criação do 'Dia Municipal do Rock', Kiko Zambianchi fala sobre a carreira e o mercado musical em em entrevista ao Jornal Ribeirão
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Kiko, você nasceu em Ribeirão Preto e iniciou sua trajetória musical aqui, inclusive tocando em festivais e formando a banda 'Vida de Rua'. Qual a importância da cidade e desse período inicial na sua formação como artista e quais lembranças mais fortes você guarda?
Ribeirão foi muito importante na minha carreira, foi lá que tudo começou realmente, e assim, eu tive uma escola que era muito bacana, onde tinham várias...eu passava das seis da manhã às seis da tarde nessa escola, e a gente tinha aula de xadrez, aula de fotografia, aula de artes industriais, entendeu? A gente tinha aula de teatro, tinha festivais de música, então isso eu acho que pra mim foi muito importante, então acho que nessa área de educação, Ribeirão, na época que eu morava lá, e que eu estava de 1976 até 1980, entendeu? Era muito forte essa relação com a arte na cidade, sempre teve muitos artistas ótimos, músicos e artistas plásticos, então isso tudo influenciou muito na minha carreira, e foi lá que eu comecei a fazer apresentações com músicas autorais, porque inicialmente eu comecei em festivais, fazendo festival, eu comecei a ganhar muito festival, até que eu com 17 anos, eu fui apresentado num festival que eu tinha ganhado o segundo lugar, e no festival a mulher apresentou assim, e em segundo lugar o veterano em festivais, então assim, com 17 anos eu já tinha ganhado muitos festivais e as pessoas já me tratavam como um veterano, então eu fui obrigado praticamente a partir pro lado autoral, e foi aí que tudo começou assim, com a minha carreira mesmo como compositor e artista.
As lembranças que eu tenho são sempre muito boas, desde de tocar em lugares, em bares que não aceitavam que eu fosse tocar, porque ninguém queria ouvir música autoral, geralmente os bares tocam cover e tal, então os poucos bares que eu consegui tocar, os poucos lugares que eu fui remunerado para tocar em Ribeirão, são lembranças que eu guardo até hoje, e as pessoas que me ajudaram e todo aquele processo de montar o show com uma banda totalmente iniciante, então isso aí foi muito legal pra mim e faz parte mesmo do meu carinho pela cidade, todo esse trabalho que foi feito ali inicialmente.
A Câmara de Ribeirão Preto aprovou, recentemente, a criação do Dia Municipal do Rock, que será celebrado no dia do seu aniversário. Como se sente em relação a essa homenagem?
Ah, eu fiquei, eu fiquei feliz, né, porque você ser lembrado é sempre bom, né, principalmente enquanto você tá vivo, né. E eu agradeci, foi uma iniciativa, né, do Tiago Adorno e do vereador, né, o Danilo Scochi. E foram eles que tiveram essa ideia e só me informaram, né, há três dias atrás eu não sabia desse processo. Então, foi uma surpresa e, assim, eu tô super lisonjeado de ter sido homenageado em Ribeirão Preto, né, que é a minha cidade e a cidade que eu gosto.
Você faz parte de uma geração muito vencedora do Rock nacional. Como você vê a renovação do gênero no país. Que novas bandas você acredita que têm potencial para atingir o mesmo patamar que Capital, Kid Abelha, Paralamas do Sucesso e tantas outras?
É, quando a gente surgiu, a coisa era bem diferente, a gente tinha que passar por quase um vestibular, você passava pelo diretor artístico, aí ia pra reunião, ia pra rádio, aí tinha que conseguir fazer sucesso, porque senão não ia pra frente, você tinha que cantar afinado, porque não existia afinador, você tinha que tocar realmente, porque não tinha loop, não tinha toda a tecnologia de hoje, então era uma geração diferente, os artistas tinham que realmente cantar, realmente ser afinados e tocar também direito, isso aí eu acho que é o que faz falta hoje no mercado, a gente precisa começar a dar valor pra essas pessoas que fazem som realmente, que tocam, que cantam e que tenham um talento visível.
Eu não gostaria de citar muitas, muito bandas, porque eu conheço tantas bandas e tantos artistas legais, não digo só de rock, eu conheço de vários outros estilos também, que eu vou esquecendo o injusto ou esquecendo de alguém, mas existem muitos artistas bons, prontos para serem lançados e que, provavelmente, se existisse um apoio da mídia, a gente teria muito mais artistas com conteúdo e que poderiam somar na cultura brasileira de rock ou de qualquer outro gênero.
Nos últimos anos, a música migrou das mídias (CD/DVD) para as plataformas digitais. Você acredita que essa mudança impactou no surgimento e na consolidação de novos artistas?
Eu acho que surgiram muitos artistas com a internet, com as mídias digitais e tal, mas eu não acho que isso signifique mais qualidade, mesmo porque hoje a pessoa pode entrar no YouTube, pode gravar um negócio com inteligência artificial, ele pode fazer um negócio que já está quase pronto, ele vai lá e só canta um pouco e ainda quando canta ele vai lá e afina tudo, a voz, sabe, em algum programa.
Então assim, quando você vai ver esse artista ao vivo não é nada daquilo que você esperava e às vezes se torna uma coisa meio repetitiva, as músicas meio repetitivas, a gente tinha uma diferença entre artistas na época que eu fui lançado. Você vê que são vários artistas de rock, cada um tinha uma personalidade, tinha um estilo, um jeito de cantar, o que hoje já é mais complicado, a coisa já está mais homogênea. Você vê artistas que, às vezes, não sabe quem é, porque é tudo muito igual.
Então acho que não dá para a gente comparar o que aconteceu anteriormente para o que acontece hoje, mas o que aconteceu foi que o mais importante, no meu ponto de vista, é que as culturas locais meio que se perderam, quando você ia numa cidade, a cidade tinha o cantor local, tinha o pessoal que fazia arte, que era local, que tinha aquela visão deles, e hoje em dia com a internet, com as mídias sociais, você acaba, as pessoas acabam todas tendo as mesmas informações e acabam todas se repetindo e gostando dos mesmos artistas e entrando nessa onda de internet, de não procurar, mas esperar as coisas aparecerem na sua tela, e isso realmente dificultou, porque hoje em dia, por dia, são lançadas 60 mil músicas no mundo, então é um tanto de música que você não vai conseguir ouvir, você vai ouvir e mais de 70% são coisas ruins, e você tem que correr atrás para achar alguma coisa boa ali, às vezes essas coisas boas ficam escondidas, porque no outro dia você nem ouviu 300 músicas e você já tem mais 60 mil músicas para 60 mil lançamentos de artistas e de músicas que no outro dia, então em dois dias são 120 mil músicas, é uma coisa quase impossível de se seguir.
Outra coisa também foi o lado do Jabá, que antes você tinha a rádio e a televisão, hoje em dia você tem a rádio, a televisão, o Spotify, o YouTube, você vai somando tudo, o Instagram, você vai somando tudo e isso acaba dificultando mais ainda, porque a pessoa saiu de duas coisas que ele tinha que fazer ali para fazer um monte de coisas e todas elas, se você não paga, você não vai para frente.
Eu, por exemplo, eu não pago, então o meu crescimento é lento e vai ser assim em qualquer mídia social, entendeu?
E aí essa dificuldade, eu acho que a maior dificuldade desse sistema que existe hoje é essa quantidade de artistas e que na maioria das vezes não são pessoas legais, você tem que competir com alguma gracinha, alguma coisa que vira meme, que é engraçada e que um passa para o outro e tal, e isso daí não é uma coisa que ajuda, não.
Você continua ativo na música, lançando singles recentes como 'Bem Longe' e 'Quero Viver a Vida'. Quais são seus projetos atuais e o que o público de Ribeirão Preto pode esperar de Kiko Zambianchi nos próximos meses em termos de shows, novos álbuns ou colaborações?
É, agora eu estou na turnê do acústico Junto com o Capital até dezembro. São vários shows e a gente já tá fazendo isso desde o início do ano e vamos continuar até final de dezembro. Recebi uma proposta para lançar Primeiros Erros lá nos Estados Unidos com um cantor americano e eu, de fazer shows também, então eu vou fazer show no Brasil, vou fazer as coisas aqui, mas o projeto que eu tô trabalhando e que as pessoas estão mais empolgadas são esses aí com os americanos, eu também tenho um outro show que eu faço com os músicos americanos também, que é o Amarraquim, o Poupesco, a Veishozi, né, o Corey Glover e a gente faz um projeto que é para arrecadar dinheiro para as entidades que ajudam pessoas carentes, isso aí a gente vai fazer em março de novo no Brasil, em janeiro. A gente vai fazer Montevidéu e Buenos Aires também com esse show, é uma coisa muito bacana. Estamos fazendo vários eventos, várias coisas, tem músicas que vão ser lançadas também, que foram gravadas junto com esses artistas, que são grandes feras. O Amarraquim tocou com David Bowie, tocou com Michael Jackson, com a Madonna, com Miles Davis, tocou com o Hebbie Hancock, que é um dos melhores bateristas do mundo, e a Veishozi tocou com o Peter Gabriel, com o Audi Miola, tocava com Stanley Clarke, né, aí tem o Poupesco, tocou com a Madonna, com o Steve Wonder, tocou com um monte de gente também. George Benson tocou com a Jennifer Lopez, aí você tem mais o Eric, que em março vem pra cá também, o Eric Dutch, que é o tecladista do Black Rose, que também vai fazer com a gente em março aqui.