Influencers Escancaram os Efeitos Colaterais da Democracia em Ribeirão Preto
Análise - Um Olhar Sobre Bigodini e Esquerdogata, mais para o lado psicológico do que político.
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Em Ribeirão Preto, dois nomes ganham destaque não apenas pelo volume de seguidores na web, mas também pelos episódios polêmicos que envolvem alcoolismo, conflitos com a Polícia Militar e processos judiciais. De um lado, Roger Ronan da Silva, o vereador Bigodini (MDB), representante do Centrão. Do outro, Aline Bardy Dutra, a influenciadora e militante conhecida como “Esquerdogata”, filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT). Ambas figuras públicas do município, com perfis diferentes, mas que revelam algo mais profundo sobre a política e a democracia nos dias atuais: quando a liberdade traz consequências “escancaradas”, muitas vezes desconcertantes.
No Plano Físico Político: Processos Disciplinares e a Luta pelos Seus Lugares
Bigodini enfrenta um processo de cassação na Câmara Municipal de Ribeirão Preto, enquanto “Esquerdogata” vê seu destino pendurado no julgamento interno do PT. O indiciamento do vereador pelo inquérito que apurou seu envolvimento em acidente automobilístico — comprovadamente sob influência de álcool e com mentiras nas declarações — coloca o ambiente político local em clima pesado pela cassação. No entanto, membros do partido e da política já trabalham por uma pena alternativa a cassação. Afasta-se, assim, o vereador das funções legislativas com pena severa de “afastamento” de 180 dias com fins terapêuticos — uma alternativa com viés humano.
Por sua vez, Aline, que já acumula passagens judiciárias e envolve-se em problemas com a Polícia Militar, enfrenta processo disciplinar no seu partido, com risco eminentemente de expulsão. Todavia, a influencer busca correntes políticas internos da executiva nacional tentam evitar a punição máxima. A solução proposta: manter sua filiação ao PT, impedir seu lançamento como candidata em 2026, mas preparar seu retorno para 2028, possivelmente preenchendo lacuna deixada pela vereadora Duda Hidalgo, que tem grande chance de ascender à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Tal medida permitiria a ambos contornar momentos difíceis sem excomungação definitiva.
Personagens Diferentes, Atração Semelhante
Ambos carregam personalidades e trajetórias díspares, mas encontram convergência em seus problemas pessoais — alcoolismo, transtornos como bipolaridade e TDAH são mencionados como pano de fundo que pode explicar, pelo menos parcialmente, suas condutas controversas. Essa complexidade humana, singularidade e vulnerabilidades parecem atrair público — seguidores que se espelham não necessariamente em sua vida política, mas na capacidade de serem protagonistas, “personagens” com os quais as pessoas se envolvem intensamente em redes sociais e debates públicos.
É possível afirmar que Bigodini e “Esquerdogata” possuem alto índice de criatividade e forte habilidade para se manter no foco da atenção da população, contribuindo para o exercício da “democracia em espetáculo”. São figuras que, apesar do envolvimento em crises e contradições, representam a pluralidade e os dilemas da sociedade contemporânea em um cenário democrático plural e por vezes caótico.
No Plano Sensível: A Fragilidade da Vida Pessoal Exposta e o Impacto na Responsabilidade Pública
Quando a vida pessoal entra no jogo político, as “areias movediças” aparecem com força. O que dizer da capacidade que essas pessoas têm para conduzir, além de si mesmas, um mandato popular? Bigodini e Aline demonstram fragilidades emocionais evidentes, e suas dificuldades particularizadas acabam expostas, criando dúvidas legítimas sobre o preparo para papéis que exigem estabilidade, responsabilidade e empatia para “cuidar do povo”.
Enquanto cidadãos em processo de tratamento e recuperação, ambos enfrentam um desafio adicional: equilibrar a gestão da própria saúde mental com a cobrança pública e institucional que recai sobre qualquer parlamentar ou ativista político. São tarefas árduas que requerem suporte profissional, compreensão social e um ambiente político mais humano e menos punitivo.
Essa “democracia transparente”, que escancara seus efeitos colaterais, também deve incluir reflexões profundas sobre o quanto o sistema eleitoral e partidário está preparado para lidar com figuras públicas que transitam entre brilhantismo e vulnerabilidade, entre força e fragilidade emocional.
Bigodini e “Esquerdogata” não são meramente casos isolados de comportamento problemático ou escândalos políticos. Eles são, em muitos aspectos, símbolos de uma “democracia escancarada”, que traz à tona as contradições de seus atores e os limites da capacidade do sistema político em lidar com questões humanas complexas.
Que a sociedade e suas instituições possam aprender a acolher tais nuances — onde o direito de errar, a busca por tratamento e a possibilidade de evolução se harmonizem com as demandas por ética e responsabilidade. Afinal, cuidar da vida própria já é um desafio; cuidar do povo, por meio de mandatos eletivos, exige muito mais preparo emocional e intelectual do que muitos supõem.
É o retrato de uma Ribeirão Preto em que a política e as redes sociais se entrelaçam para produzir resultados que incomodam e provocam debates intensos — uma democracia em seu estado mais genuíno, cru e complexo.