Negros acreditam mais em empresas do que no poder público, diz estudo

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Negros acreditam mais em empresas do que no poder público, diz estudo
Negros acreditam mais em empresas do que no poder público, diz estudo - Foto: Agência Brasil
Negros acreditam mais em empresas do que no poder público, diz estudo - Foto: Agência Brasil

Para a população negra do Brasil, o empresariado inspira mais confiança (85,3%) do que os governantes (68,7%). Além disso, há um sentimento de impotência dos negros diante de várias consequências do racismo, como: violência policial (22%), o apagamento em veículos de comunicação (17,6%), a falta de oportunidades de trabalho (20,7%) e o racismo religioso contra vertentes afrobrasileiras (19%).

Essas constatações são da pesquisa O Consumo Invisível da Maioria: Percepções, Gatilhos e Barreiras de Consumo da População Negra no Brasil, apresentada hoje (10), no Fórum Brasil Diverso 2025. O evento ocorre no Memorial da América Latina, em São Paulo.

Elaborado pelos institutos Akatu, DataRaça e a Market Analysis, o estudo surgiu a partir do expressivo valor que esse grupo da população movimenta todos os anos, de R$ 1,9 trilhão. O levantamento consultou 1 mil pessoas negras de todas as regiões do país.

Os especialistas tomaram como referência dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada no segundo semestre deste ano. 

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Na avaliação do presidente do DataRaça, Maurício Pestana, a intensa divisão política no país, entre brasileiros da direita e da esquerda, dá pistas sobre por que os entrevistados encaram com maior otimismo a atuação das empresas do que do poder público. A descoberta, contudo, foi uma surpresa para a equipe de pesquisadores. 

"Isso se explica, acredito, por essa polarização que vivemos no Brasil há desconfiança de um lado e de outro e porque nas empresas temos regras claras de missão, de não à discriminação, de obrigações que de fato precisam ser cumpridas. Já no governo vivemos um histórico de leis que às vezes pegam, às vezes não, de cumprimento variável", pondera.

"Talvez o Estado devesse simplesmente seguir mais as regras para mudar essa percepção. O Brasil tem uma Constituição que não deveria precisar ser lembrada o tempo todo. O cidadão deveria já saber que a lei vale, mas aqui as leis são frequentemente burladas e isso acaba refletindo nesses níveis de confiança", critica o especialista, também fundador do Fórum Brasil Diverso.

Credibilidade

As organizações não governamentais (31%) e as instituições religiosas (30,7%) são as que mais têm credibilidade, algo perceptível também no índice de desconfiança, os menores registrados na lista, de 8% e 7,6%, respectivamente.

Na sequência, com porcentagem significativamente menor, estão as companhias nacionais de grande porte (17,1%) e as multinacionais no Brasil (16,1%). Estas últimas geram um nível de desconfiança quase equivalente, de 12,1%.

Já em relação aos governos, 12,9% afirmaram depositar muita confiança, contra 24% de falta de confiança. Quanto às pequenas e médias empresas nacionais, as porcentagens foram, respectivamente, de 10,4% e 8,3%.

O relatório que sintetizou os resultados destaca, ainda, as pessoas na faixa etária de 35 a 44 anos como as mais céticas, já que 36,7% delas suspeitam das intenções dos governos.

Três grupos foram identificados como os que mais confiam nas mensagens governamentais: as mulheres (73,2%), os jovens (75,7%) e os idosos (76,9%). 

Racismo no coletivo e na vida pessoal

No recorte de classes sociais, a que mais dá crédito tanto ao empresariado como aos governantes é a classe A (90% e 78,9%). A classe B figura como a mais crítica: o patamar das pessoas que não acham que empresas merecem seu voto de confiança é de 17,3% e de 37,7% quanto aos governos.

Aos olhos da população negra, as questões sociais com impacto mais profundo na vida dos brasileiros como um todo são a violência e a criminalidade (88,3%); a corrupção (84,6%); a violência policial contra a população negra (72,9%); a desigualdade social (71,8%); a inflação e o aumento dos preços dos produtos (68,6%); problemas ambientais e mudanças climáticas (66,9%); a falta de postos de trabalho (66,3%); a falta de vagas de emprego para negros e discriminação na esfera profissional por cor/raça (65,6%); discriminação em compras/serviços por cor/raça (64%); e ameaças à família e valores morais cristãos (61,7%). 

Os entrevistados também responderam sobre o que de mais grave os atinge pessoalmente, quando enumeraram a violência e a criminalidade (78,9%); a corrupção (78,6%); a violência policial contra a população negra (70,1%); a inflação e o aumento dos preços (68,8%); problemas ambientais e mudanças climáticas (65,7%); desigualdade social (62,9%);  falta de emprego para negros e discriminação no trabalho (60%); ameaças à família e valores morais cristãos (61,7%); e (59,5%) e discriminação em compras/serviços por cor/raça (54,3%). 

Entre os setores que mais têm cativado os brasileiros negros, por conta de suas políticas abertas à diversidade, estão o de higiene, beleza, vestuário e moda e o e-commerce (comércio virtual).

Os shoppings, o comércio de alimentos e a indústria farmacêutica, por sua vez, ainda devem se tornar mais convidativos. 

Ao todo, um em cada três clientes negros (34,8%) foi vítima de discriminação ao contratar um serviço ou comprar um produto no último ano. Em sete de cada dez casos, os alvos foram tratados de modo distinto a partir de gestos mais sutis ou disfarçados.

O racismo foi manifestado por meio de olhares que transmitiam cisma, desconforto ou julgamento e abordagens que destoavam do padrão oferecido aos demais clientes, por exemplo.

Os locais onde mais houve atos racistas foram lojas de roupas, calçados, perfumaria e acessórios (24,5%); shoppings (17%); supermercados (16,8%); órgãos públicos (5,5%); loja de eletrodomésticos, eletrônicos ou informática (3,9%).