Expansão das facções aumenta a criminalidade nas cidades do interior
Compartilhar notícia
A desconcentração da violência letal nas grandes cidades, com a interiorização do crime e o avanço das facções para médias e pequenas cidades do país é destacada pelo Atlas da Violência 2025 Retrato dos municípios brasileiros e dinâmica regional do crime organizado, divulgado nesta sexta-feira (7). O levantamento foi elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
O relatório evidencia dois motivos para esse fenômeno. Em primeiro lugar, as cidades que eram mais violentas há 10 anos conseguiram reduzir a letalidade. Por outro aspecto, em face da interiorização do crime, muitas cidades menores passaram a vivenciar em maior número a violência letal.
De acordo com o Atlas, as capitais como Fortaleza, São Luís, Goiânia, Cuiabá e o Distrito Federal registraram reduções superiores a 60% nas taxas de homicídios entre 2013 e 2023. Fato que contrasta com o avanço da criminalidade e das disputas entre facções em municípios médios e interiores, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, que passaram a concentrar episódios de violência antes restritos às metrópoles.
Diminuição dos homicídios
Mesmo com a ampliação territorial das facções criminosas, o levantamento mostra uma continuada redução dos homicídios no país, tendência que se observa desde 2018.
Em alguns estados, o processo começou muito antes, como é o caso de São Paulo, estado onde as mortes por causas violentas vêm diminuindo de forma contínua há mais de duas décadas.
Expansão das facções
O relatório indica também que as facções criminosas estão presentes em todas as unidades da Federação, mas de maneira desigual. Em alguns estados, a presença de vários grupos alimenta disputas territoriais intensas e letais, como ocorre na Bahia, onde atuam o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) em aliança com facções locais, como o Bonde do Maluco e o Comando da Paz.
A mesma disputa por território ocorre também em Pernambuco, o estado abriga pelo menos 12 facções em conflito. Elas são responsáveis por impulsionar as altas taxas de homicídios no estado.
No Amazonas e no Amapá, as guerras entre CV, PCC e organizações regionais, como a Família Terror do Amapá e o Cartel do Norte, têm provocado escaladas de violência em cidades médias e portuárias estratégicas, aponta o Atlas.
Já em outras regiões, os conflitos por domínio de territórios são de baixa intensidade, revelando uma convivência relativamente estável entre grupos rivais. É o caso de São Paulo, onde prevalece uma espécie de pacificação, resultante do domínio de mercados ilegais por uma única e poderosa organização criminosa, o PCC.
O mesmo acontece também em Minas Gerais. O estado também abriga diversas facções fragmentadas, mas com menor grau de conflito aberto, e Santa Catarina, cuja atuação do Primeiro Grupo Catarinense (PGC) ocorre em um cenário de violência mais controlada e pontual.
Diversidades de estratégias
O Atlas da Violência 2025 também destaca para o que chama de diversidade de estratégias entre os grupos criminosos. Segundo o documento, os grupos criminosos com estruturas mais estáveis e voltadas ao lucro tendem a conter o uso da violência ostensiva, enquanto organizações menores e fragmentadas recorrem com mais frequência a confrontos armados para afirmar poder e manter o controle territorial.
Infiltração em atividades lícitas
O levantamento alerta para o fato do crime organizado se infiltrar em atividades produtivas lícitas e na gestão pública. Esse fenômeno, segundo o Atlas, ameaça o Estado Democrático de Direito, com expansões na política, nas atividades produtivas lícitas e na gestão e contratos das administrações públicas. Essa expansão econômica e institucional das facções, segundo os autores, representa uma das faces mais perigosas do crime organizado contemporâneo.
No caminho contrário dessa expansão do crime organizado, o relatório identifica avanços em políticas públicas qualificadas de segurança, que os do documento chamam de revolução invisível na segurança pública. A partir da década de 2010, essa transformação tem englobado cada vez mais estados e municípios, combinando ações preventivas, qualificação policial e o uso de inteligência integrada.
Dados de homicídios
Enquanto os municípios grandes (mais de 500 mil habitantes) tiveram, em 2023, taxa média de 23,6 homicídios por 100 mil habitantes, as cidades médias (entre 100 mil e 500 mil habitantes) apresentaram taxa média de 24,2 por 100 mil e as pequenas (até 100 mil habitantes) de 20 homicídios por 100 mil habitantes.
Os números mostram que os 20 municípios mais violentos do país possuíam, em média, população de 330 mil habitantes e uma média das taxas de homicídio estimadas de 65,4, o que é quase três vezes da média nacional. Por outro lado, a média das taxas de homicídio estimadas no grupo dos 20 municípios com menor letalidade era de 3,8. Portanto, comparando os 20 municípios mais e menos violentos do país, a prevalência de homicídio no primeiro grupo foi 17 vezes maior do que no último grupo uma diferença maior do que aquela entre a taxa de homicídio do Brasil e da Europa, em que essa relação é de 10,4 vezes.
Em 1.548 (29,6%) dos 5.237 municípios classificados como pequenos não houve nenhum homicídio estimado (registrado ou oculto). Entre os de tamanho médio, foram encontrados 10 com taxas acima de 60 homicídios por 100 mil habitantes. No outro extremo, 51 municípios médios apresentaram taxas menores de 10 homicídios estimados por cem mil habitantes. Já entre os 46 classificados como grandes, oito apresentaram taxas abaixo de 10.