Sociedade civil pede avanços na igualdade racial durante 5ª Conapir

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Sociedade civil pede avanços na igualdade racial durante 5ª Conapir
Sociedade civil pede avanços na igualdade racial durante 5ª Conapir - Foto: Agência Brasil
Sociedade civil pede avanços na igualdade racial durante 5ª Conapir - Foto: Agência Brasil

Após uma lacuna de sete anos, a 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, realizada até sexta-feira (19) em Brasília, reúne cerca de 2 mil pessoas de todo o país, em plenárias que duram o dia inteiro. São 1,7 mil delegados eleitos, 200 convidados e 50 observadores que debatem as 740 propostas aprovadas nas etapas anteriores, nas conferências municipais, estaduais e regionais

Com o tema Igualdade e Democracia: Reparação e Justiça Racial, a etapa nacional tem os objetivos gerais de estruturar políticas de superação de desigualdades, de enfrentamento ao racismo e de promoção do desenvolvimento socioeconômico justo e diverso, no país que teve cerca de 350 anos de escravidão de pessoas negras.

Para a coordenadora nacional da União de Negros e Negras pela Igualdade (Unegro) e ocupante da vice-presidência do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR), a baiana Marina Duarte, a Conapir de 2025 é memória porque marca os 30 anos da Marcha de Zumbi dos Palmares, em 1995, e as duas décadas da primeira Conapir, ambas em Brasília. Mas, a quinta edição da conferência representa também o futuro. Um futuro com reparação, dignidade para o povo negro, que é vida.

Reparação histórica

A ativista Marina Duarte defende que o eixo da reparação histórica da V Conapir deve ser destacado, porque o movimento negro luta pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 27/2023 que cria o Fundo Nacional de Reparação Econômica e de Promoção da Igualdade Racial (FNREPIR),abastecido com recursos da União.

O fundo é o início, porque a gente não faz reparação sem orçamento, sem dinheiro. As pessoas precisam entender que o povo só quer viver um futuro feliz, com democracia e a dignidade que a gente merece.

O integrante do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial e coordenador executivo da 5ª Conapir, Nuno Coelho, encara o fundo como a forma compensar os danos sofridos pelo afro-brasileiro e de consolidar o avanço da política de igualdade racial no Brasil com o financiamento de políticas nacionais, estaduais e municipais.

Brasília (DF), 17/09/2025  Nuno Coelho, participa da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Foto: José Cruz/Agência Brasil

Nuno Coelho, do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, na  5ª conferência nacional da entidade - Foto José Cruz/Agência Brasil

A conferência está organizando uma metodologia para que este fundo possa ser, não somente uma reparação histórica, mas também pecuniária. Porque quando a gente desce para [a gestão nos] municípios do Brasil, há uma carência enorme de recursos para a execução das políticas públicas. 

Porque esse nível de reparação histórica, que se faz apenas pedindo desculpas pelo período de escravidão, não entende que o processo de escravização no Brasil ainda se dá, por exemplo, por meio do mercado de trabalho que escraviza, diz o gestor público.

O governo federal é favorável à PEC 27/2023. O Ministério da Igualdade Racial (MIR) tem dialogado com representantes do Congresso Nacional. A ministra da pasta, Anielle Franco, entende que a reparação histórica já está em curso.

Brasília (DF), 16/09/2025  Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco (c) participa da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Foto: Conapir/Divulgação

Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco (c) participa da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Foto Conapir/Divulgação

A reparação financeiramente é importante, sim. Mas, reparação também já está em curso quando se vê as universidades lotadas de pessoas negras, quando você entra em um consultório e tem um médico negro.

Sinapir

No evento de abertura da V Conapir, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou a instituição do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, em 2010. No evento, os municípios de Pelotas (RS), Itabira (MG), Contagem (MG) e as capitais Salvador e Fortaleza aderiram ao Sinapir.

No entanto, quinze anos depois, a adesão dos municípios a essa estrutura que articula a implementação de políticas públicas para combater as desigualdades raciais é avaliada como baixa. O sistema tem a adesão de 100% dos estados, mas de somente 278 municípios, o equivalente a 5% do total.

A vice-presidente do CNPIR, Marina Duarte, adianta que o aumento da adesão dos municípios ao Sinapir será o foco principal do CNPIR em 2026.

Criar um conselho representa uma ajuda que a sociedade civil dá ao governo local e que vai trazer a voz do povo. Muitas vezes, o gestor não tem como ir a cada localidade. Então, um conselho será esse braço, essa mão para que se consiga fazer políticas públicas ali.

O Sinapir é a ponta de lança para que a gente consiga ramificar as políticas do ministério, diz a vice-presidente do CNPIR, Marina Duarte.

O coordenador executivo da 5ª Conapir, Nuno Coelho, lembrou que o Sinapir é fruto do Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010) e avalia que os municípios têm dificuldade de compreender a transversalidade e o financiamento da política. Eles [prefeitos] entendem que isso é uma materialidade exclusiva dos municípios. E acham que não têm condições de deixar de atender saúde, educação e habitação para atender a política de igualdade racial. Porém, a política de igualdade racial atinge de modo geral todas as instâncias do poder público.

Para esclarecer sobre os benefícios da adesão ao sistema, a ministra da Igualdade Racial explica que o governo federal tem feito uma campanha de divulgação do Sinapir, mostrando a falta de compreensão sobre a importância da promoção da igualdade racial em nível local.

A gente 'letra' as pessoas sobre como é importante essa política, que precisa chegar na ponta, ter um órgão PIR [de Promoção da Igualdade Racial], e ter um município que adere, com o prefeito e com pessoas também que reconheçam essa luta.

Anielle Franco deixa claro que, mesmo com a divulgação, a adesão ao Sinapir depende da vontade política dos governantes locais e, por isso, é preciso que a população eleja representantes comprometidos com a causa da igualdade racial.

Racismo ambiental e a COP30

No ano de realização da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30) no Brasil, os conferencistas da V Conapir também debatem como o racismo ambiental tem aprofundado os impactos das mudanças climáticas.

O coordenador executivo da V Conapir, Nuno Coelho, chama a atenção para as comunidades negras, quilombolas, periféricas e de povos tradicionais indígenas em todo o mundo, que estariam mais expostas a formas intensas de desastres ambientais como enchentes, deslizamentos e secas, resultando em ampliação das desigualdades sociais e ambientais.

É um absurdo imaginar que o problema ambiental não seja coletivo. Precisamos entender: o Brasil, as grandes nações e, sobretudo, os países em torno da região amazônica, que a Amazônia legal é uma casa comum. O que afeta lá atinge a todos.

Para ele, é preciso haver financiamento e o tratamento preventivo de desastres.

A conselheira no CNPIR Marina Duarte lembra que o racismo ambiental não aparecia nas COPs anteriores e que a população brasileira precisa falar sobre isso na COP30, já que o assunto abrange várias áreas.

Essa é uma das pautas de transversalidade urgente, pois é preciso ter dignidade ambiental e de vida. Há os direitos humanos envolvidos, porque esse é um direito humano básico: ter uma condição melhor de moradia, de vivência e de saúde.

A ministra Anielle Franco destacou a importância de abordar questões como moradia digna, financiamento e demarcação de terras indígenas durante o evento da ONU. Ela destaca a necessidade de ouvir as comunidades afetadas, aprender com elas e a importância de que a luta contra o racismo ambiental seja contínua, com base na participação social.

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de abertura da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial  CONAPIR. Centro de Convenções Ulysses Guimarães  Brasília (DF)  Foto: Ricardo Stuckert / PR

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra Anielle Franco abrem da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial  - Foto Ricardo Stuckert/PR

É importante que a COP30 seja um local de escuta. Chegar à COP falando sobre racismo ambiental, sobre a importância de os territórios [quilombolas] serem titularizados, das terras indígenas também serem demarcadas. Tudo isso precisa ser levado em conta. A COP não pode ser a luta de apenas um único dia ou de 20 dias. Tem que ser contínua.