Após denúncias, MP abre procedimento para apurar VPNI de professores

instituição apura ilegalidade do benefício, instituído para manter remuneração por jornada acima da legal

, atualizado

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Professor em sala de aula na rede municipal de educação
Professor em sala de aula na rede municipal de educação - Foto: Guilherme Sircili
Professor em sala de aula na rede municipal de educação - Foto: Guilherme Sircili

O Ministério Público de Ribeirão Preto abriu um procedimento para apurar denúncias que envolvem possíveis irregularidades sobre a implantação da VPNI (Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada), benefício pago a professores da rede municipal de ensino. A suspeita é que a benesse tenha sido criada como forma de burlar uma decisão judicial que determinou o corte de jornada para profissionais da rede.

O benefício, que foi criado após decisão judicial que limitou a jornada semanal dos professores a 40 horas e teria como objetivo "compensar financeiramente" os educadores que tiveram redução de carga horária, em especial aqueles que antes trabalhavam acima de 32 horas semanais.

Segundo a nova denúncia, professores PEB III passaram a receber mais com a incorporação do VPNI em seus holerites, mesmo levando-se em conta os períodos em que extrapolavam a jornada com aulas eventuais, atingindo as 58 horas, jornada considerada inconstitucional.

O promotor Naul Felca, do Grupo Especial de Defesa da Educação (GEDUC) do MP, lidera os trabalhos para apurar os efeitos danosos que a nova lei — que regulamentou o VPNI — pode estar causando ao sistema educacional do município. Paralelamente, o promotor Alexandre Padilha tem atuado na análise de possíveis danos ao erário público decorrentes da implantação do benefício, que já foi objeto da Notícia de Fato (MPE/SP 1149-57/2025).

A Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo (PGJ/SP) também investiga a constitucionalidade da legislação municipal que criou modalidades específicas de aulas extraordinárias, conhecidas como AE-TDA (Aulas Extraordinárias de Trabalho Direto com Alunos), surgidas após decisão do Tribunal de Justiça que considerou inconstitucional a jornada semanal de 58 horas-aula para parte dos professores.

Se confirmadas, as denúncias podem dar origem a ações judiciais, promovidas pelo MP, que podem vir a contestar os benefícios e seu pagamento. Procurada, a prefeitura defendeu a legalidade da medida.

Distorções salariais e pagamento irregular de horas extras na mira

De acordo com as denúncias recebidas pelo MP, professores beneficiados com a VPNI recebem remunerações brutas que superam significativamente os valores da tabela salarial oficial da categoria. Além disso, muitos continuam realizando aulas extraordinárias — ou seja, horas extras — não previstas na proposta original do benefício.

Um exemplo destacado no relatório apresenta o professor D.R.M. recebendo salário bruto de até R$ 15.347,09 em junho de 2025, enquanto outros docentes com a mesma carga horária têm rendimentos de 40 a 50% inferiores. Isso gera distorções dentro da categoria e provoca reclamações quanto à equidade salarial.

As discrepâncias são contestadas por profissionais da educação, que alegam prejuízos, injustiças e falta de equidade decorrente das últimas deliberações do Sindicato dos Servidores para a concessão da VPNI. A principal reclamação é que o benefício vem sendo concedido a professores com carga horária superior às 40 horas semanais, contrariando as regras que motivaram sua criação e implicando em sobrecarga e remuneração inadequada para outros docentes que mantêm jornadas equivalentes.

Além disso, professores da rede municipal enfrentam disputas internas e queixas sobre o afastamento de docentes para funções técnicas ou cargos em comissão, fora da estrutura funcional legal, o que os afasta das salas de aula.

Há, ainda, críticas à modalidade "Professor Uber" — nome dado a profissionais que substituem ausências momentâneas —, o que tem afetado diretamente professores com redução de jornada na base (PEB I), que reclamam da falta de acesso e priorização na escala de aulas extraordinárias.

Conflito de interesses e questionamentos de movimentos sociais

O MP apura, ainda, se já conflito de interesses envolvendo professores que integram equipes técnicas da Secretaria de Educação (SME) e, simultaneamente, são beneficiados com o pagamento da VPNI — o que levantou suspeitas por parte do Movimento Brasil Livre (MBL).

A entidade afirma que professores terceirizados passam a receber mais do que legalmente permitido mesmo após os reajustes salariais nas últimas negociações da data-base.

A reportagem teve acesso a uma relação com cerca de 22 nomes de professores e seus respectivos salários atualizados, comparados ao mês de outubro de 2024, ofertados por denunciantes que apontam uma sistemática que extrapola os limites legais e pode impactar negativamente o orçamento público municipal.
A justificativa do movimento é que, hoje, professores trabalham menos e recebem mais com a solução do VPNI. Por respeito à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), os nomes não foram divulgados.

Prefeitura defende benefício

Em resposta a questionamentos sobre o pagamento do VPNI a um grupo seleto de professores, a administração municipal informou que o benefício foi fruto de diálogo com o Sindicato dos Servidores e demais secretarias envolvidas, constituindo-se uma opção provisória para lidar com a questão.

Entretanto, o acompanhamento dos dados disponíveis no Portal da Transparência da Prefeitura revela que os valores pagos desconsideram a teoria oficial e a previsão descrita: professores que recebem o benefício continuam a ministrar horas extras e mantêm salários superiores, mesmo após a modulação das jornadas.

A administração ainda afirmou que as denúncias apresentadas são genéricas. Afirmou, ainda, que, em verificação interna, realizada em conjunto com a Secretaria de Administração, não foram identificadas irregularidades.