Apostas esportivas: jovens começam cada vez mais cedo
Quase 1 milhão de estudantes não ingressarão na faculdade por gastarem com casas de apostas
, atualizado
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Sob a sedutora promessa de enriquecimento rápido, cresce no Brasil uma epidemia silenciosa e alarmante: o vício em apostas online entre crianças, adolescentes e jovens adultos. Esse fenômeno, impulsionado por marketing agressivo, influenciadores digitais e a facilidade de acesso às plataformas de jogos, está afetando profundamente a saúde mental, as relações familiares e o futuro profissional de uma geração.
As apostas digitais, como as populares "bets" e o chamado "Tigrinho", deixaram de ser uma curiosidade de nicho para se tornarem um fenômeno cultural. A publicidade massiva e a associação com celebridades criam um imaginário de sucesso instantâneo. No entanto, o que se esconde por trás dessas promessas são histórias de compulsão, prejuízos financeiros e abandono escolar.
Uma pesquisa do Unicef revela um dado preocupante: 22% dos adolescentes brasileiros afirmam ter feito sua primeira aposta até os 11 anos de idade. Isso demonstra como a falta de regulação efetiva e a facilidade para burlar sistemas – muitas vezes com uso de CPFs falsos – têm permitido que menores de idade mergulhem precocemente em uma atividade de risco.
As apostas online ativam o sistema de recompensa do cérebro, liberando dopamina, o neurotransmissor relacionado ao prazer – o mesmo envolvido no consumo de álcool ou drogas. Essa liberação contínua acaba por gerar uma dependência química e emocional. A compulsão que se instala leva a efeitos devastadores: ansiedade, irritabilidade, insônia, isolamento social, queda no rendimento escolar, abandono dos estudos e até envolvimento com dívidas e pequenos crimes.
O presidente da Associação Brasileira de Profissionais de Educação Financeira (ABEFIN), Reinaldo Domingos, afirma que o vício em jogos de azar é um dos mais destrutivos por ser silencioso e socialmente tolerado. "O jogador acredita que está no controle, mesmo quando já perdeu esse controle há muito tempo", explica.
Grande parte dos jovens entra nesse universo acreditando que o sucesso financeiro está a um clique de distância. Campanhas publicitárias exibem influenciadores exibindo carros de luxo e viagens internacionais como resultado direto das apostas. No entanto, a realidade é bem diferente: segundo o Instituto Locomotiva, 53% dos apostadores jogam com a expectativa de ganhar dinheiro, mas para cada vencedor existem milhares de perdedores.
Para jovens em situação de vulnerabilidade financeira, esse tipo de propaganda é ainda mais perigoso. Cria-se a ilusão de um atalho para escapar da pobreza – um caminho que, na prática, os afunda ainda mais.
O vício em apostas não destrói apenas os apostadores. Suas famílias também sofrem. Histórias de casamentos desfeitos, endividamento coletivo, negligência parental e perdas patrimoniais expressivas são cada vez mais comuns. No ambiente escolar, professores relatam casos de alunos que passam noites apostando e chegam às aulas sonolentos, agressivos ou desinteressados.
De acordo com pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Mantenedoras de de Ensino Superior, 34% dos jovens não estarão nos bancos da faculdade por causa de apostas. A estimativa para o primeiro semestre de 2026 indica que cerca de 986 mil pessoas podem deixar de ingressar na educação superior privada devido ao comprometimento financeiro com apostas. Esse número representa mais de um terço dos quase 2,9 milhões de potenciais ingressantes.
A pesquisa ouviu 11.762 pessoas entre 18 e 35 anos de todas as regiões do país, das quais 2.317 completaram o questionário. O levantamento foi feito entre os dias 20 e 24 de março de 2025 com o público que demonstrava interesse em iniciar uma graduação em instituições particulares.